15 de maio de 2016

Fragmento #16511

Penso e sinto que todos estamos a cada dia cada vez mais tristes e inertes e conformados com o progressivo estado de desumanização e coisificação das pessoas, a destruição dos laços sócio-afetivos em detrimento ao puro pragmatismo de interesses, a sobreposição do bem comum coletivo ao interesse privado, o isolamento pessoal disfarçado pelas redes na era virtual e a mercantilização totalitária da vida. Tempos de puros negócios. Alguns atuam no desenvolvimento da capacidade de fingir e avançar nesse jogo destrutivo, rumo ao esfriamento da alma, à castração dos sentimentos, dos sentidos e da capacidade de percepção do ao redor, do todo, do outro, de si. Outros se entregam a dignidade confessional da insatisfação, da tristeza, do vazio e da desilusão, em recusa à regra geral ditada. Nesse sistema de signos, máscaras e normas, os primeiros são autodenominados vencedores. Os segundos são denominados perdedores pelos autodenominados vencedores. O dilema do honesto é se abster da platéia, atravessá-la sobre o palco da mundo caminhando nessa cada vez mais rôta corda bamba, no picadeiro desse macabro espetáculo naturalizado e normalizado. Alguns, em meio ao jogo contínuo, enlouquecem para presevar sua razão, seus sentimentos, sua dignidade perante à si mesmos, suas própria história de vida. Seguem dançando provocadora, livre e despretensiosamente pela corda bamba, pois sabem que a suposta rede de proteção não passa de mera miragem ideológica. Quando o circo todo pegar fogo, saltarão desde o trapézio em acrobacia intrépida a travessar a lona pelos furos chamuscados arrombados e abertos rumo ao Sol secular reinante, com semblante guerreiro, lindo e despojado, sobrevoando compassivamente a platéia dos vencedores a urrar em desespero, queimando vivos dentro do próprio inferno do qual ajudaram a criar. Alguns deles escaparão e tornarão a empunhar suas mal-amadas e amedrontadas vidas armadas contra nós. Encontrarnos-ão de tacape em punho, de flecha arqueada, sorriso colorido, flor-penacho no cabelo, chama magmática nos olhos e profética fúria ancestral no confronto. Querem sangue. Querem tudo que puderem tomar. Sempre quiseram. Nunca nada bastará ao vosso pobre e gélido vazio. E com o sangue deles e nosso, regando o sal da terra dos campos de batalha, re-primaveroraremos o deserto dos medíocres. Assim como foi, como é e como sempre haverá de ser, na secular luta dos povos. Como ensinou-nos nosso único e implacável senhor, feitor dos mundos e reitor dos destinos, o antideus Tempo. 

RL